22 de ago. de 2008

como sentar num ônibus.

prólogo.

Mas por quê estou sentado nesse lado do trem se bate tanto sol? Estou com sono. Esperava chegar na hora marcada, mas já vi o relógio passando na última estação: são 15:12. A hora marcada deve ter passado há três estações. Eu esperaria. Posso pensar numa desculpa, isso não falta numa cidade deste tamanho, mas se bem que isso não quer dizer muita coisa. Reclamam de tédio o tempo todo e li em qualquer lugar que "aventura" só acontece quando é narrada, acho que foi num livro de Sartre, não sei, esqueço as páginas onde encontro coisas que fazem sentido pra mim. Acontece que o que faz sentido pra mim muda tão rápido e no momento seguinte já é algo corriqueiro, mas deve haver coisas que fazem sentido o tempo todo. Essa, por exemplo, da "aventura" é uma delas. Quem poderia imaginar que estou numa grande aventura agora? O pessoal que senta ali na sombra deste vagão?! Pode ser, mas logo o trem faz alguma curva e o sol volta a bater nas costas deles, aí terão algo para se preocuparem mesmo, nada de "será que aquele rapaz está vivendo uma aventura agora?", nada disso. Vivo um fato que nem sei justificar. A verdade é que nem devia estar me locomovendo dentro deste trem, sabe. De duas uma: estar num café ou estar em casa. Não estou em nenhuma dessas alternativas, estou entre uma e outra: vou para um café querendo tanto estar em casa. Mas saí de casa hoje e estou indo encontrar aquela moça que gosta de Cortazar. Espero que o assunto não se detenha demais nele, li apenas o livro dos cronópios e famas. Não tem problema, acho que consigo dialogar por um tempo sobre isso. Faço conexões com outras coisas, saio do café como um cara bacana, companhia agradável e tudo mais. Bem, mas a coisa é que isso não é tão importante pra mim, essa de me sair como um cara bacana pra uma pessoa que vou encontrar tão pouco, de repente, só hoje. Acordei bem disposto esta manhã, foi isso. Logo volto pra casa. Se chegar no café às 15:40 fico até umas 17:00, pior que depois disso os trens estão lotados, mas ficar até às 20:00 é demais! Vou começar a ficar monótono, esquisito, completamente enfadonho. O mesmo pode acontecer com ela. Pior é que uma hora teremos de anunciar a partida: que não seja eu! Provavelmente será, fico meio assim de parecer grosso. Não sei, acho que não devia ter vindo. Ficava em casa seguro, longe de sorrisos sustentados, opiniões combinadas e polêmicas a la carte. Já está tarde. Já saí de casa e isso foi feito para ser nada. Não é o que vou contar quando quiser contar alguma coisa. Isso não sai deste evento, é natimorto. Alguma coisa deveria acontecer agora, mas ela já me viu:

_ Oi, está esperando muito tempo?




20 de ago. de 2008

soneca.

Já passei a detestar o som do teu alarme, já decorei todas as nuanças monofônicas do fim do teu sossego e a luz que escapa da sua persiana revela o que já tateio sem hesitações. E finjo a respiração pesada para o sobressalto matinal: já aguardava esse alívio três minutos antes da primeira chamada. Já pressenti as formas das primeiras obrigações antes mesmo de interromper sonhos presos às têmporas frias e nelas que aguardo a continuidade do sossego insuflado. Aperte, então, o atraso consentido para recomeçarmos sempre com um bom dia.