21 de fev. de 2008

but I've been so B.


se todos os dias pego o mesmo ônibus com o mesmo motorista e o mesmo cobrador os quais me dão os primeiros sinais dos meus vinte minutos de atraso no serviço e agora não adianta correr porque o trânsito de são paulo é sempre uma merda melhor encostar na poltrona e dormir inúteis minutos antes de chegar e ouvir pela milésima vez o white album do beatles e sentir o som diminuindo enquanto a guitarra do george harrison gentle wheeps e acordar com good night com o sol ardendo na minha testa close your eyes and I'll close mine e manter os olhos abertos com toda força do universo e não dar bom dia quando entro no meu departamento mas não sou antipática e no fim acabo conversando com a pessoa ao lado sobre leis trabalhistas e sair correndo pra casa pra não perder o dia mas logo vejo que já passa das dez horas da noite e tenho poucas horas de sono mas amanhã eu consigo chegar no horário até eu me deparar com o mesmo motorista e o mesmo cobrador e aqueles vinte minutos descontados do meu salário se eu não tivesse inventado de tomar aquele toddy que começa a azedar no meu estômago e dear prudence apenas começou a tocar, se sou assaltada enquanto estou na cadeira do dentista eu sei que não poderia ser mais bizarro mas é uma coisa que qualquer um está sujeito a ter uma arma apontada na cabeça enquanto faz um tratamento de canal, se vou para uma sala de cirurgia anestesiada olhando as luzes dos corredores enquanto cantorolo hallelujah na voz do jeff buckley no fundo da minha cabeça, se saio semi-bêbada da casa de alguém e caminho pela paulista numa manhã nublada e deserta pensando num jeito rápido de voltar pra casa para que tudo seja a mesma coisa e me desculpe por quebrar a rotina morna mas é que não sei o que me deu ontem à noite mas precisava andar por ruas desconhecidas e freqüentar apartamentos de desconhecidos, se ligo para um velho amigo num acesso fugaz de me sentir bem comigo e as coisas e as pessoas e os acontecimentos e de repente me arrepender amargamente quando a voz esquecida do outro lado me pergunta no que estou trabalhando e como anda a faculdade e quais são os meus planos pra quando eu me formar não eu não sei porque na área de letras não há muito campo pra quem não pretende dar aula como eu e no mais ando sem dinheiro pra pagar o último ano desse curso que venho arrastando nas coxas meu deus! preciso desligar esse telefone, mas apareça em casa qualquer dia desses você ainda não conhece a minha casa desde que saí da minha mãe e nunca mais vamos nos falar porque você não é meu amigo e não sei porque tive essa idéia estúpida de te ligar e não esqueça de mandar um abraço na sua mãe sim eu apareço agora você tem o meu número e meus contatos você não tem desculpa pra sumir e sinceramente espero que você nunca me procure porque sabemos que isso não irá nos levar a lugar algum foi bom ter falado com você e não esqueça daquela cerveja que nunca vamos tomar um beijo, se naquele dia frio e chuvoso estou em casa e resolvo fazer um café e ler um bom livro talvez o estrangeiro de albert camus mas é que os filtros de papéis acabaram e ando com preguiça de ler e acabo fazendo por milhares de vezes o peregrinação de duas mãos computador-tv-computador ad infinitum, se repito que seja doce como sempre lembro dos dragões do caio e isso soa forçado então prefiro não falar e só penso mas mesmo pensando pareço estar além da margem do livro e nada soa como literatura nem a marginal que se propõe a estar exatamente onde eu disse estar além do corte porque não estou no rio dos anos oitenta nem cheiro cocaína ou tampouco cresci no mandato de qualquer ditador como o figueiredo por exemplo quando eu nasci o tancredo já estava quase subindo no poder e nem mesmo me lembro da recessão no governo sarney e sou fruto mesmo do tédio dos anos noventa e nem adianta tentar dar uma de hermética e tentar escrever um poema à la AnaC porque não escrevo poemas e não escrevo prosa e não reproduzo na prática exatamente as coisas que parecem ser um pouco mais profundas quando são contadas, é porque é raso e passa sem que eu perceba e quando percebo não reconheço o momento pois quando me toco não parece ser as coisas que estão acontecendo numa seqüência de cenas mal ensaiadas de um filme b qualquer durante a madrugada em que já deveria estar dormindo e sim, é o mesmo motorista hoje.

16 de fev. de 2008

feeling like going home.

o dia amanhece para fazer um clichê de um filme qualquer da sofia copolla. é hora de voltar, mesmo com o corpo doendo. é estranha a sensação de que nunca chegaremos em casa, mas a gente sempre chega de um modo ou de outro. a augusta não é mais a mesma. são as subidas, a calçada irregular, o tanto de gente no contrafluxo. o sol já apareceu e nossas caras brilham sujas. mais uma estação. o metrô parece ainda mais abafado. olho para a máquinas de livros, vejo: "A Arte da Guerra" e mais um auto-ajuda corporativo ao lado. eu nem estou olhando pros livros. eu nem estou pensando em livros. vamos, vamos embora. o dia amanheceu e não suporto dormir com o quarto inundado de uma luz quieta. mas é que vai demorar e acho que não chegaremos em casa antes das nove.

5 de fev. de 2008

Início

Que o tédio seja o marco inicial. Que na falta de algum movimento, quando a poeira repousa sobre os móveis, pesadas, tocarem as superfícies esquecidas nos cantos dos cômodos, eu esteja entre tudo que recebe o toque de algum abandono desentendido e não saiba mais o que é cinza, pó, indiferença ou a pressa das coisas quando cada movimento é tão devagar. A idéia seria uma outra palavra entre quietudes e preguiças vespertinas, mas o som é o mesmo desde o grande atrito quente das moléculas, simplesmente as mesmas ondas que reverberam. Pensava ainda que para reparar toda inanição bastava abrir a boca e comer, mas me viria o gosto deste mesmo som que lhes oferto. Se não bastasse, abriria a janela, mas as partículas levantam do asfalto e entram. Sim, agora com algum movimento.
Foi que da voz velha saiu um sim.