30 de jan. de 2014

para alguém partindo para o porto

meu bem se alguma hora desse dia que partilhamos
por ventura
me ver chorando
finja que não viu absolutamente nada
saia catando suas coisas pelos cantos
e debaixo desses olhos
saiba que não há nada nesse espaço
que já não foi cantado ao décimo tanto
que eu não vou me dar ao trabalho
e parar para dizer que 
não é nada esse absoluto tudo que 
você pode ter me dado
por esse intervalo
em que as canções retardam
o carinho que quis reter
e essa mania de guardar
o que se leva
nessa água
nessa porta
que espalho agora pelo meu rosto

Apenas finja que não viu o que foi
do que se vê e siga
o teu rumo e não dói
isso que se deixa 
levar de desconhecer
o que te meço
em palmas e polegadas
desse mar que engoli
para evitar o desconforto
de esclarecer
que hoje choro
pelos motivos mais óbvios
desse idioma
que só te chama nas cadências
do mais bonita
de nós duas

eu sigo e espero
o sal
o gosto
o nome


29 de jan. de 2014

to the valley below

sempre estou mais para um café antes de me levantar e atender o pedido e ceder esse assento para a outra parte que impaciente me olha batendo os pés no assoalho oco desse chão que aquela moça andava de salto agulha. Mais um café e já disse que saio e te deixo discos, retratos e um pouco do que havia debaixo da minha pele:

retomo tudo quando mudarmos de forma
e essa senhora nada discreta
tomou o lugar que sempre teve

Quanto mais forte o café, mais forte o fumo
que servia para sentir suas unhas
no meu pulso

Foi com a voz trêmula que vi seu refrão que no estribilho
ainda escondia
a sua garganta cheia de ar

pouca diferença faz
pra quem só escuta o próprio nome

Mais um café pra quem não sabe mais o que responder
quando estamos assim tão calados
acertando despertadores
errando partidas


25 de jan. de 2014

pela metade

tentava assistir um filme argentino
acho que vi algo parecido em ingles um dia
um taxi driver portenho

nao li o livro inteiro que ela me emprestou
acho que nao pretendo devolver
o que ela acreditou 
que eu podia
concluir

amanha talvez eu nao faça nenhum mantra
nao defenda a classe oprimida
ja resolveram a falta linha
da riqueza paulistana
em algumas
gotas sublínguais

Já tentei remover todos os anúncios
maliciosos da minha janela
e só tenho paciencia para um beijo
e algum silencio

e eu querendo devolver com uma citaçao
em portugues
do filósofo
que nao me dei ao trabalho de ler
eu disse

eu nao leio
mas seguro bem as cigarrilhas
e sinto o gosto no fundo da colher
e faço preguiçosas massagens
cardíacas
dessa pessoa tao normal

nunca tratei de fotografar esta cidade
acredito que nao vivo num filme
acredito que nao há prostitutas nessa rua

vizinhos discretos e a cada ano
mudam de carro
(tres anos é o tempo máximo)
o seguro da tua conversa insólita
ninguém me garante

ainda vejo as árvores
nao reviso rimas
nao reconecto tuas linhas
que vieram dos teus dedos comidos

a divina secura na boca
vai chamar a última ligaçao
gravada insistentemente

sei das coisas do seu quarto
e tudo faz mais sentido
quando limpa os cinzeiros
e joga no fundo
essas olheiras de me ver

as pessoas morrem ou vao pra europa
as teias devem ser retiradas com uma vassoura
limpa
porque as paredes precisam
nao oferecerem nenhum ponto de fuga
que é pra eu olhar
e nao ver nada

te ligo mais uma vez
pego dois onibus
e volto

sem nunca devolver o livro
longe de fazer sentido

removo a conclusao
te ligo
no quarto toque
desisto 


17 de jan. de 2014

tabacaria química

penso escrever um e-mail ou coisa do tipo/ mas me canso ao pensar nas consequencias que isso pode ter/ sim/ pois um dia me falaram que cansamos os outros/ eu nao quero cansar ninguém quando me canso das coisas quietas | poderia inventar fórmulas mágicas e exercícios de repetiçao do silencio/ mas é exatamente isso que estou fazendo agora/ conduzo esse silencio do meu futuro interlocutor e imagino suas caras/ espero a boca se abrir/ espero o corte desse incomodo usual/ espero demais e nao vou provar que sou sublime por agora/ escrita seca nos olhos enuviados da fumaça densa desse tabaco adocicado/ doce/ no fundo da língua o que pedi com os olhos de mais de trinta kilos/ recolho meu peso nao como questao de bom senso/ mas por saber daquele outro cansaço/ agora o de pedir mais uma fórmula descafeinada de permanencia/ paro para pensar/ o copo no canto da mesa e nem sei quem era aquela que se sentou sozinha/ pensava esta em estruturas carbonicas e disseram que essa indisposta metafísica está na ausencia de uma fantástica ligaçao iônica que esqueceu o nome| o e-mail faria pouco sentido já que nao trago nunca urgencias urgentes/ trago o que se resolve nesse aroma que agora já volta para a garganta sem absolutamente nada além do que já passou/ sem prazer estético algum/ sem nenhuma forma que se preze/ só o reconhecimento de que te gastei da melhor forma possível/ a do teu cansaço para o meu alívio o meu beijo  um até logo ou algo do tipo

10 de jan. de 2014

à tua porta

é aquele jeitinho especial de me destruir pelo bom senso quando julgava à luz de uma conclusao qualquer que hoje, talvez hoje o melhor que se pode fazer é o nada daqui pra frente. Me despeço com cuidado e cerimonias sabendo que amanha vou dizer alguma coisa entre os intervalos das notas e diria ao som delas que eu desejaria que nao fosse tao importante assim a ponto de me oferecer a mais profunda metafísica por uma mera crítica e que eu gostaria que nao arrancasse da minha boca finalmente quieta os tantos anos que tenho de vida e aqueles que espero sem voce antes de te ligar te pedindo o que esqueci de mim.
voce devolve, voce sempre devolve e eu caminho por aí com sacolas furadas.

8 de jan. de 2014

caixinha de tempo

isso era pra ela 
pra dizer que ela está aqui
 isso era para aquela que está com dois pés e meio atrás de uma valsa de improviso e que nao aceita a conduçao líquida da acidez de um tango com estruturas exatas ela já está enquadrada nas raízes de moore que fez seu vestido mais apertado na regiao frontal dois sempre dois quando o café decanta mas ela nao vai esperar essa história inteira pois sabe que também andei socando essas palavras e quando eu tremer ela vai dormir porque se cansou desses nirvanas diários em que nao conseguiu se safar da claridade que desvia sua janela e ela vai andar por todos os cantos do quarto por onde ela entrou e os macacos pulam amanha e ela me manda uma fotografia sem a transfiguraçao de um sorriso encomendado ela fica melhor com a boca reta numa línha contínua de uma orelha que diz nao e a outra que diz talvez e ouve quieta

_ eu gosto de voce

           ela vai rir ela vai rir muito ela vai mexer no porta-retratos e virar para si a imagem que diz

                 _ eu também


ela ouve e dorme tranquila - ela vai acordar e virar o ventilador porque de fato está muito quente